sábado, 11 de julho de 2020

Édipo Rei, de Sófocles: o clássico que resiste ao tempo


Representada pela primeira vez em 430 a.C., "Édipo Rei", de Sófocles, é - assim como as demais obras sobreviventes do autor - uma peça imperdível aos amantes da Literatura, do Direito, da História e do Teatro.
Com uma linguagem bastante distinta da que estamos acostumados nos livros atuais, mas nem por isso desconfortável ou ruim, Sófocles conta ao leitor a fatídica história de Édipo, trazendo, para tal, um dos mais memoráveis elementos da cultura grega: a mitologia; e é a partir dela que começaremos nossa abordagem.

O Oráculo de Delfos, hoje reduzido aos vestígios de sua existência, era o local destinado à consulta dos cidadãos gregos, que poderiam obter a resposta para basicamente qualquer questionamento. Isso ocorria através das sacerdotisas do deus Apolo, que, em estado de transe, conseguiam entrar em contato com o sobrenatural, consultando seres superiores para sanar as mais diversas dúvidas existentes. Em uma dessas consultas, uma informação devastadora chegou ao conhecimento de Laio, então rei de Tebas, e sua esposa, Jocasta: quando crescido, seu filho mataria o próprio pai e se casaria com a própria mãe. Uma vez em posse dessa previsão fúnebre, o casal decidiu que a criança precisava ser sacrificada, para o bem de todos.

Alguns anos se passam e a importância do Oráculo para a construção do enredo aparece novamente: Édipo, o novo Rei de Tebas, vê a cidade se definhar em razão de uma peste. Sem saber como proceder, recorre aos deuses, que prometem resolver o problema em troca da resposta de um enigma: quem matou o Rei Laio? A resposta pode parecer óbvia para aqueles que já conhecem a trama. Contudo, mesmo se for o caso, recomendo fortemente a leitura da peça original, que nos dá uma generosa dose de cultura grega.
Atenção: spoilers - explicação da obra.
Como é de se imaginar, matar o próprio herdeiro, sangue de seu sangue, não é uma tarefa razoável para um ser humano com o mínimo de sanidade. Por conta disso, a morte do garoto amaldiçoado foi deixada nas mãos de um escravo de confiança do Rei. Todavia, tomado por pena e compaixão, o trabalhador entregou o fruto da comunhão entre Laio e Jocasta a um mensageiro, que, da mesma forma, o ofereceu ao Rei Pôlibo (ou Pólibo), o qual o criou como filho, chamando-o de Édipo.

Édipo matou o próprio pai biológico durante uma briga supérflúa, sem saber que era seu filho. Após este fato, partiu para Tebas e se tornou o novo rei, casando-se com Jocasta - sua mãe. Não aguentando a dor da verdade, a mulher tira sua própria vida, e Édipo fura seus próprios olhos com um broche - afinal, não havia mais nada que valesse a pena ser visto por ele. A partir disso, foi criada a teoria do renomado psicanalista Sigmund Freud: o complexo de Édipo. Para ele (de forma bem resumida e leiga), os homens, durante o desenvolvimento sexual, passam a sentir atração pela mãe, ao passo que possuem certa repulsa pelo pai - história familiar, não é mesmo?

segunda-feira, 30 de março de 2020

Desatenção (conto autoral)

Era um dia frio e nebuloso – algo estranho para o verão –, mas sequer me atentei a isso enquanto colocava a água para ferver. Minha mãe sempre disse que eu deveria ser mais atenta. Posicionei as ervas numa jarra de prata e calculei aproximadamente o tempo até que o líquido pudesse ser ali despejado. Nesse período, planejei utilizar um velho truque da família: acrescentar o suco de um limão para dar sabor ao chá.
Peguei a tábua no armário, bem como a fruta, que se encontrava exposta sobre a mesa. Abrindo a gaveta, não consegui encontrar a faca que havia idealizado usar. Adicionei uma nota mental: conversar com as crianças sobre o perigo de pegar instrumentos afiados escondido.
Após encontrar um lâmina que parecesse minimamente afiada, comecei a partir o limão ao meio. Estava quase na metade do processo, quando a chaleira começou a apitar, fazendo com que eu pulasse de susto e, consequentemente, cortasse meu dedo.
- Merda... – Falei ao ver algumas gotas de sangue escorrendo pelo meu dedo. Peguei o pano de prato pendurado ao meu lado para estancá-lo. Como podia um corte tão pequeno sangrar tanto?
Reclamei para mim mesma caminhando em direção ao fogão, quando ouvi um barulho de porta se abrindo. “São sete da manhã. Será que os meninos acordaram antes hoje?” – pensei. Girei o botão, cessando o fogo e o consequente grito histérico. Segurei o recipiente com a mão esquerda, para evitar que o sangue entrasse com contato com a bebida, quando senti uma sensação repentina de dor, fazendo com que eu derrubasse tudo que se encontrava sob minha posse. Um toque agressivo atingiu meu ombro. Olhando para baixo, uma faca atravessada em meu ventre fazia com que o corte do meu dedo parecesse brincadeira de criança.
De repente, estava em meu quarto. Não lembrava do que sonhara, mas sabia que havia sido algo ruim.
Com certa angústia, levantei, lavei meu rosto e escovei os dentes. Olhei  para o relógio: 6:45h. Amarrei meu cabelo e me dirigi à cozinha, pronta para preparar meu chá matinal.
Era um dia frio e nebuloso – algo estranho para o verão –, mas sequer me atentei a isso enquanto colocava a água para ferver. Minha mãe sempre disse que eu deveria ser mais atenta.